
Dr. Jordan – Portanto, a autoginofilia é a fantasia, é uma fantasia sexual em geral, e caracteriza frequentemente os homens que se tornam transexuais e começam a travestir-se mais tarde na vida. Desenvolvem uma excitação sexual por se imaginarem ou actuarem como sendo do sexo oposto.
Penso que um pouco disso… Já agora, falaste do facto de querer ter alguns dos atributos masculinos clássicos, como a autoconfiança e a coragem, e aí por diante. E que eras elogiada quando se referiam a ti dessa forma.
Penso que muito do que acontece a estes homens que desenvolvem estes fetiches sexuais mais tarde na vida é que há uma parte deles que está a clamar pela exploração e desenvolvimento do seu lado feminino. Mas em vez disso acontecer psicologicamente e começarem a integrar, digamos, compaixão, cuidado e preocupação com pessoas em vez de coisas. Em vez de integrarem essas propensões do sexo oposto, começam a actuar como se fosse uma realidade concreta.
Tu foste definitivamente seduzida a fazer isso. Também disseste, e não me deixes aprofundar isto mais do que aquilo com que te sente confortável, que havia especificamente um elemento sexual. Havia alguma coisa nas tuas fantasias sobre o facto de seres um rapaz? Disseste que ainda te sentias atraída por mulheres. Tocámos nisto, mais vale esclarecer. Qual era a natureza da interação com a sexualidade? Quer dizer, é obviamente relevante.
Chloe – Eram fantasias sobre ser um homem, sobre ser do sexo masculino e ter atributos masculinos no meu corpo. Além disso, muitas delas envolviam ter uma parceira, o que nunca explorei na vida real, porque não sentia qualquer atração emocional por mulheres. Não queria ter uma relação com outra mulher e, por isso, nunca me preocupei em agir nesse sentido. Mas acho que se pode dizer que eu tinha um análogo feminino da autoginofilia, se é que há uma palavra para isso. Acho que seria autoandrofilia, mas na altura não compreendia isso porque era muito nova.
Dr. Jordan – Olha, na adolescência a gama de fantasias sexuais pode ser extremamente vasta. Há uma diferença entre a fantasia e a vida real, as pessoas fantasiam com coisas que não fazem na vida real e o facto das fantasias poderem tornar-se patológicas se as pessoas se debruçarem sobre elas. Mas o facto da fantasia abranger um leque mais vasto do que o comportamento é, na verdade, mais uma indicação da capacidade criativa da fantasia.
Fazemos coisas nos nossos sonhos, por exemplo, ou representamos cenários nos nossos sonhos que nunca ocorreriam na vida real e isso deve-se ao facto de parte da capacidade humana para o engenho ser a capacidade de imaginar múltiplos cenários diferentes, e alguns deles podem ser extremos. Por exemplo, se estou zangado com alguma coisa, posso ter fantasias bastante violentas e pensar “oh meu Deus, de onde é que isto veio?”, mas isso não significa que as vá concretizar, ou pelo menos, espero que signifique que não as vá concretizar.
A nossa vida de fantasia é mais vasta do que a nossa vida real e a representação das nossas fantasias é limitada pela necessidade social, em certo sentido. O simples facto de teres essas fantasias não é uma indicação de algo que seja em si mesmo patológico, mas está bem dentro do domínio da fantasia sexual adolescente normativa, diria eu. Talvez tenha sido um pouco mais exagerada no teu caso por causa da testosterona e talvez até mais por causa do teu temperamento mais masculino, mas ainda assim está bem dentro do intervalo da normalidade.
O que é que te aconteceu quando começaste a tomar as hormonas e como é que reagiste a isso?
Chloe – Comecei a ter algumas mudanças físicas, como na minha aparência, e também algumas mudanças comportamentais, senti-me mais confiante, comecei a desenvolver uma espécie de tendência competitiva especialmente com os rapazes da minha idade, e comecei a socializar um pouco mais como eles faziam. Também, obviamente porque estava a tomar androgénios, comecei a sentir um aumento muito forte da minha libido, que era muito difícil de acompanhar. Começou a tornar-se um problema para mim, sem que eu me apercebesse.
Infelizmente, desenvolvi uma dependência da pornografia e também tive uma relação muito pouco saudável com o meu corpo e a minha sexualidade, e ainda hoje continuo a ter.
Dr. Jordan – Então, em relação à pornografia, eram imagens femininas ou masculinas? Ou o que é que era maioritariamente?
Chloe – Maioritariamente femininas.
Dr. Jordan – Eram maioritariamente femininas, mas não tinhas qualquer interesse em estabelecer uma relação com mulheres. No que respeita a encontros, pelo menos em princípio, querias estar com rapazes. Credo, é uma mensagem muito confusa para atravessar. Nem me digas, deves ter andado mesmo em cinco direcções ao mesmo tempo durante esse período. Não há um caminho claro para seguir em frente a partir disso. Como é que te orientaste?
Chloe – Não consegui, não consegui mesmo, porque não podia, não tinha oportunidades de namoro e não podia explorar esse tipo de coisas. Isto tornou-se uma fonte de angústia para mim no liceu. Sentia-me frustrada, tinha desejos que não conseguia satisfazer e, para além disso, estava a ver todos os meus colegas a terem relações românticas e sexuais e a terem esse tipo de desenvolvimento, enquanto eu, pelo menos, sentia que estava completamente atrasada.
Dr. Jordan – Esses são efeitos complexos da testosterona. O lado positivo era que tinhas mais confiança e mais autoconfiança, eras mais competitiva, tinhas um desejo sexual acrescido, o que é uma bênção mista. Quais foram as consequências negativas para ti do tratamento hormonal?
Chloe – Também me esqueci de mencionar que, como não conseguia encontrar um parceiro na vida real, acabei por recorrer a encontros online, o que só me deixou mais stressada porque tinha sentimentos por alguém que nem sequer podia ver ou tocar. Isso só aumentou o meu stress.
Na maior parte das vezes, acabava por ser usada por outras pessoas, quer para apoio emocional, quer para obter imagens mais íntimas de mim. Mas era o mais próximo que conseguia chegar da verdadeira intimidade e senti-me bastante só durante o liceu. Acabei por desenvolver uma depressão e isto foi definitivamente um fator determinante.
Os efeitos da testosterona, no início, faziam-me sentir muito bem, como se fosse quase comparável a um estimulante. Enquanto estava a tomar os bloqueadores, diria que há um período de cerca de um mês entre o início destes e o da testosterona, e durante esse período de tempo, porque não tinha hormonas sexuais no meu corpo, senti-me frequentemente muito letárgica, um pouco deprimida. Quando recuperei as hormonas no meu corpo, a minha energia voltou.
Pode dizer-se que houve um período de lua de mel que durou, talvez, não mais do que um ano e meio. Mas descobri que estava mais propensa à ansiedade e também, diria que cerca de um ano depois de ter iniciado a testosterona, comecei a ter algumas dificuldades com o meu trato urinário. Tive a minha primeira ITU (NT: Infeção do Trato Urinário) e depois, eventualmente, evoluiu para a incapacidade de esvaziar completamente a bexiga, ter de urinar frequentemente ou mesmo ter sangue na urina.
Nada disto foi mencionado nos meus formulários de consentimento. Nem sequer sabia que se tratava de um problema resultante da toma da testosterona, até que deixei de a tomar e a situação piorou.
Dr. Jordan – Agora, enquanto tudo isto está a acontecer, também estás a percorrer o caminho da transição. Passaste dos bloqueadores para a testosterona. Agora tens cerca de 14 anos. Credo, isso é horrível.
Chloe – No final do oitavo ano, o bully de que falei antes agrediu-me sexualmente. Antes disso, estava a tomar testosterona há vários meses, estava muito confiante e nunca me preocupei em tentar esconder o meu peito ou qualquer coisa do género, porque tinha uma copa B ou menos e era bastante magra, usava muitas vezes camisas largas e nunca pensei que isso fosse um problema.
Continua
Traduzido por Maria Azevedo (Associada)
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