Daisy Strongin estava tão convencida da sua identidade transgénero que, aos 18 anos, começou a tomar testosterona obtida através de uma clínica LGBTQ+ no centro de Chicago. Dois anos depois, aos 20, fez uma mastectomia dupla. Na altura, Daisy não se preocupou com as repercussões que poderia ter na sua saúde, tais como esterilizar-se ou nunca poder amamentar. Mas apenas um ano depois de ter retirado os seios, Daisy apercebeu-se de que tudo não passava de um erro e decidiu detransicionar para realizar o seu sonho de ser mãe.
Acho que assim que decidi que queria fazer mudanças permanentes no meu corpo, estava determinada a não mudar de ideias. Sabia que haveria certas coisas que seriam irreversíveis, mas tinha-me treinado mentalmente para ver isso como uma coisa óptima, como “a minha voz nunca mais vai voltar? Ótimo, fantástico, não quero que isso aconteça.
Tenho 24 anos, transicionei em 2015 quando tinha 17 anos. Fui trans durante 5 anos, quase certos, e depois comecei a detransicionar em Maio de 2020, com 22 anos.
Acho que na escola secundária foi quando me comecei a sentir muito estranha e desconfortável. Eu queria apresentar-me de forma masculina o tempo todo. Quando fiz 18 anos, soube que podia obter testosterona através de consentimento informado, o que basicamente é: quando vamos à clínica e eles revêem todos os riscos possíveis. Na minha experiência ao falar com eles, eles como que minimizaram os riscos, eles realmente focaram-se mais nas alterações estéticas que eu iria sofrer.
A minha voz, de facto, ficou mais grave, porque é mesmo grave para uma mulher, e não podes mudar isso, uma vez engrossadas as cordas vocais não há volta atrás.
Eu sinto que a minha cara sofreu mudanças masculinizantes permanentes, ainda me crescem alguns pêlos faciais, e eu tenho sorte que não é uma barba completa porque muitas mulheres detransicionadas acabam por ter muitos pêlos faciais e têm de os remover com laser para se livrarem deles. Também há muitas mudanças emocionais, eu ficava muito zangada, tinha vontade de magoar as pessoas, o que nunca tinha experienciado antes.
Três anos depois de transicionar e cerca de dois anos de estar em testosterona, eu estava completamente casada com a ideia de que eu seria trans até morrer. E então, pensei “mais vale ter cirurgia de topo”.
“Cirurgia de topo” é realmente um eufemismo muito interessante que nós usamos para descrever uma dupla mastectomia. É interessante para mim que, até pessoas na comunidade trans não possam chamar o procedimento pelo que realmente é. Creio que provavelmente é porque as pessoas querem convencer outros ou querem convencer-se a si mesmas de que esta cirurgia não é nada de especial, mas é uma cirurgia que altera muitíssimo a vida.
Portanto, eu tive uma dupla mastectomia em 2018, tive uma erupção cutânea pelo corpo todo e tive de ter tubos ligados a mim que recolhiam fluído e sangue que saia de mim. Quando me tiraram os drenos, eu estava muito muito eufórica, sentia que era a coisa certa na altura. Eu nunca quis uma faloplastia, era simplesmente muito invasiva e assustadora para mim, e eu sabia que pessoas acabavam com infindáveis complicações, e eu não queria mexer nessa parte do meu corpo.
Mudei o meu nome legalmente e mudei todos os meus documentos para que eles tivessem o meu nome masculino. A minha carta de condução dizia que o meu sexo era masculino, apesar de isso objetivamente não ser a verdade. Isso foi como que “Ok, parece que está tudo. Já fiz tudo o que queria fazer, não é suposto sentir-me completamente em paz e una comigo mesma?”.
Foi isso que me foi dito que eu sentiria. Toda a gente na minha vida me tratava por “ele”, até os meus pais estavam a começar a fazê-lo. O meu pai aderiu completamente à ideia, pelo menos linguisticamente, e começou a chamar-me de seu filho. E eu sempre pensei que era isso que eu queria, mas quando ele começou a fazê-lo, eu comecei a sentir-me mesmo culpada porque eu sabia que me estava a iludir, e eu sabia que ele não me via verdadeiramente como seu filho. Como é que o meu pai me pode ver como seu filho, quando eu não sou, quando ele criou uma rapariga?
Eu sentia que toda a gente estava a mentir, eu sentia que as pessoas estavam a mentir-me e que eu estava a mentir-lhes a elas. E que eu não podia só ser quem sou de verdade.
Quando eu iniciei a transição, eu como que mais ou menos sabia que queria ter filhos nalgum ponto da minha vida. Com 17 anos de idade, pensei que isso podia ser quando eu tivesse 30 anos. E 13 anos parecem 100 anos.
Ter filhos foi uma razão enorme para eu detransicionar porque eu lembro-me, em 2019, quando eu ainda me identificava como trans, pesquisei no google “quanto é que custa uma barriga de aluguer?” Era algo como 90 000 dólares e só de pensar nisso, a adicionar ao facto do quão dispendioso é criar uma criança, eu senti-me mesmo mesmo desencorajada. E depois lembro-me de pensar “eu tenho um corpo que pode engravidar, eu posso simplesmente fazer isso, a menos que aquilo que eu fiz a mim mesma tenha tornado isso inviável. Eu não sabia. Eu estava demasiado aterrorizada para ir a um especialista em fertilidade e, possivelmente, ter essa notícia de que “és infértil e é culpa tua”. Esse era, na verdade, o meu maior pesadelo. Mas não sou.
Os últimos dois anos da minha vida têm sido mesmo loucos: o facto de eu ter detransicionado coincidiu com o facto de eu ter conhecido o meu, agora, marido. Ele conheceu-me quando eu ainda me identificava como trans, mas durante a quarentena nós ficámos separados durante 3 meses e quando nos reunimos de novo eu disse-lhe que ia detransicionar.
Se me dissessem, há dois anos, que em 2022 eu estaria casada e grávida eu não teria acreditado.
Tive de dizer à minha obstetra que costumava ser trans porque tive uma dupla mastectomia e isso é relevante para amamentar, não o posso fazer. Então, ela disse “em termos de amamentar quais são os seus planos? E quais são os seus pronomes? Porque você costumava ser trans”. “Sim, eu costumava ser, já não sou, por isso não jogo mais a esse jogo dos pronomes. Você tratar-me-ia por ela”.
Sou uma mulher, mas não é uma identidade, é apenas o que eu sou.
Independent Women’s Forum
Tradução: Maria Azevedo (associada)